quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

AS INTER-RELAÇÕES AFETIVAS- COGNITIVAS PROFESSOR-ALUNO E O SUCESSO DO PROCESSO ENSINO-APRENDIZAGEM

INTRODUÇÃO
O artigo é resultado de uma pesquisa que teve como objetivo entender como se efetivam as inter-relações no processo ensino-aprendizagem, no cotidiano da quinta série do Ensino Fundamental e desvendar o que está na base dessa atuação, na busca de meios para se adequar o processo de ensinar e aprender, a escola e o professor, à realidade de sua clientela, de forma a tornar-se possível o cumprimento dos objetivos da educação, garantindo assim, o sucesso educacional. Objetivou-se também, apreender como a prática pedagógica se desenvolve, na transição da quarta para a quinta série, procurando analisar as características cognitivas e afetivas presentes na relação professor-aluno.
A metodologia utilizada na investigação, de abordagem qualitativa, por meio de estudo de caso, permitiu analisar o problema a partir da contribuição de professores, gestores e alunos, utilizando questionários contendo questões abertas e fechadas, observação de conselhos de classe e entrevistas semi-estruturadas, o que facilitou a percepção de muitos significados que sustentam o cotidiano escolar. O estudo de caso favoreceu o contato direto e natural com a situação e indivíduos estudados, possibilitando maior compreensão do processo ensino-aprendizagem nas quintas séries do Ensino Fundamental, assim como a responsabilidade do professor no sucesso ou fracasso desse processo.
AS RELAÇÕES AFETIVO-COGNITIVAS PROFESSOR-ALUNO NA CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO E O SUCESSO DO PROCESSO ENSINO-APRENDIZAGEM
A pesquisa fundamentou-se em Jean Piaget, b de aquisição do conhecimento, elementos para a compreensão da relação professor-aluno e subsídios sobre as melhores condições para efetivação do processo ensino-aprendizagem. Piaget (1977), considerou o desenvolvimento intelectual como um processo que ocorre durante toda a vida e que é concebido em seus aspectos biológicos, cognitivos, afetivos e sociais, como um todo, por meio de fases que se inter-relacionam e se sucedem até que atinjam estágios da inteligência caracterizados por maior mobilidade e estabilidade, num processo progressivo de adaptação do homem ao meio: assimilação/acomodação e superação constante, em direção a novas estruturas. Analisando os processos de desenvolvimento mental da criança, Piaget afirma que a inteligência e a afetividade são indissociáveis. A afetividade intervém nas operações da inteligência, estimulando-as ou perturbando-as, podendo comprometer o desenvolvimento intelectual. Os mecanismos afetivos e cognitivos permanecem sempre indissociáveis, embora distintos, na medida em que os primeiros dependem de uma energética e os segundos, de estruturas. O processo educacional tem um papel importante ao provocar situações que sejam desequilibradoras para o aluno, adequadas ao seu desenvolvimento mental, permitindo-lhe a construção progressiva de seus conhecimentos, ao mesmo tempo em que vive intensamente, intelectual e afetivamente, cada etapa de seu desenvolvimento. O ensino fundamentado na teoria piagetiana é baseado na pesquisa, na investigação, na solução de problemas por parte do aluno, favorecendo o exercício operacional da inteligência e a elaboração de seus conhecimentos. Nessa proposta cabe ao professor criar situações de aprendizagem respeitando as características de desenvolvimento do aluno, orientando-o na busca de sua autonomia e realização. Wadsworth (1997), discute as relações do desenvolvimento cognitivo e afetivo do adolescente, assim como as implicações da teoria piagetiana no processo educacional e a relação dos conceitos construtivistas de matemática, leitura e escrita, alertando que o conhecimento é uma estrutura contínua e se dá por meio das interações com o mundo, permitindo a transmissão das experiências que se processam em conformidade com a estrutura cognitiva presente (esquema de assimilação). A transmissão de conhecimentos se efetiva quando há estruturas para assimilá-los e acomodá-los.
Meirieu (1998, p. 80), aprofunda a reflexão sobre o ato da aprendizagem e estabelece referências a partir das quais o professor poderá elaborar, regular e avaliar sua ação pedagógica. Analisa o “triângulo pedagógico – educando-saber-educador” e a relação pedagógica, racionalização didática e estratégias individuais de aprendizagem, no processo de ensinar e de aprender. Alerta sobre o que é aprender, como, quem é o sujeito que aprende e o que ensina, analisando a importância de se conhecer o aluno e as características psicológicas no seu momento de crescimento, suas capacidades no domínio sensório-motor, cognitivo e afetivo. Nessa relação o professor precisa trabalhar com as operações mentais dos alunos e, em especial, com a criatividade, colocando em jogo sua afetividade, favorecendo o nascimento do desejo de aprender. Segundo Coll (1994, P. 103), o processo ensino-aprendizagem se dá no domínio da interação interpessoal, pelas formas como o professor oportuniza ao aluno interagir com o objeto do conhecimento, tendo sempre claro que: A aprendizagem escolar não pode ser entendida nem explicada como o resultado de uma série de “encontros” felizes entre o aluno e o conteúdo da aprendizagem; é necessário, além disso, levar em conta as atuações do professor que, encarregado de planejar sistematicamente estes “encontros”, aparece como um verdadeiro mediador e determina, com suas intervenções, que as tarefas de aprendizagem ofereçam uma maior ou menor margem para a atividade auto-estruturante do aluno. A aprendizagem é uma atividade interpessoal, articulada pela interação do aluno e do professor, em torno da realização das tarefas escolares. Tanto professor quanto os alunos trazem para a sala de aula sua bagagem de conhecimentos, habilidades, valores e expectativas que de acordo com as relações estabelecidas poderá propiciar o desenvolvimento da personalidade do educando, assim como de sua capacidade de discernimento, senso crítico e responsabilidade individual na construção do seu saber.
Coll e Solé (1996, p. 294), afirmam que “a aula configura um espaço comunicativo regido por uma série de regras cujo respeito permite que os participantes, o professor e os alunos, possam comunicar-se e alcançar os objetivos a que se propõem”. Se as relações que permeiam o processo são saudáveis o professor favorece ao aluno a apropriação do objeto do conhecimento, construindo o seu saber. Dessa forma, torna-se importante compreender as representações mútuas que permeiam a relação professor-aluno.
A representação que o professor tem de seus alunos, assim como as expectativas quanto ao desempenho escolar podem interferir no processo ensino-aprendizagem. Da mesma forma, a representação e expectativas que o aluno tem do professor influenciam suas relações, refletindo-se nos aspectos cognitivos e afetivos, com conseqüências em seu desempenho escolar. Delors (2001, p. 90), alerta quanto à complexidade da missão educacional do mundo atual. Lembra que a escola, como um lugar privilegiado onde o saber é sistematizado, deve definir novas políticas educacionais, organizando-se em torno de aprendizagens significativas que, ao longo da vida se constituirão nos pilares do conhecimento: "aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a viver juntos e aprender a ser", garantindo que a educação oportunize "a descoberta e o fortalecimento do potencial criativo, revelando o tesouro escondido em cada um de nós". Nesse contexto, o professor é o orientador, o coordenador e o facilitador do processo de ensino e de aprendizagem. Para que sua orientação influa sobre os processos de construção do conhecimento, deve estar atento aos mecanismos das relações interpessoais nas interações com o educando, sem perder de vista que a ajuda pedagógica deve adequar-se às necessidades e características de seus alunos.
CONCLUSÕES E ENCAMINHAMENTOS
Pela análise dos dados coletados junto aos professores foi possível evidenciar que muitos dos problemas que nortearam a realização da pesquisa não eram alheios a eles.
Pela percepção das inter-relações afetivo-cognitivas professor-aluno, no processo ensino-aprendizagem, identificou-se fatores que interferem na aprendizagem dos alunos de quinta série. Os alunos demonstram a necessidade de relação de ajuda, principalmente de atenção, reforço positivo e estímulo do professor quanto às suas dificuldades individuais, na tentativa de saná-las. Ressentem-se, também, do processo de comunicação e de atividades desinteressantes, que não oportunizam ao aluno participar do processo, perguntando, respondendo e opinando, buscando construir seu conhecimento.
Piaget (1977),lembra que, para desenvolver a lógica formal, baseada em símbolos e em operações, o adolescente vai depender de seu processo de maturidade individual e da relação de ajuda de pessoas experientes.
Procurando entender o processo de ruptura e descontinuidade entre a quarta e a quinta série ficou claro o argumento de que uma das causas das dificuldades enfrentadas na quinta série é a alteração do número de professores e a fragmentação entre as disciplinas acadêmicas.
Entre os estudos destacados na revisão de literatura percebeu-se que, por trás do número de professores e disciplinas, estão os fundamentos e objetivos do tipo de trabalho que realizam e as relações que permeiam pelo processo.
Verificou-se, por meio das observações e dos depoimentos, tanto dos alunos quanto dos professores, uma proposta tradicional de ensino, centrada no professor, com aulas monótonas, privilegiando-se a exposição oral, a supervalorização do livro didático, assim como a resolução e correção mecânica de exercícios. A relação professor-aluno era vertical, com ênfase no trabalho individual, não estimulando as trocas entre os sujeitos do processo ensino-aprendizagem. Constatou-se também, a importância quanto ao grau de satisfação de alguns professores em estar ensinando na quinta série. Em sua formação acadêmica foram preparados para ensinar conteúdos específicos e não para trabalhar com adolescentes, respeitando e valorizando o momento de transição em seu processo de crescimento.
Verificou-se a diferença significativa entre as duas séries, mostrando a ruptura entre a primeira e a segunda fase do ensino fundamental. A rigidez do tempo de aula para cada professor, determinando a troca de material e a reorganização do processo de atenção e raciocínio, de acordo com a organização didática e os objetivos da aula, a cada cinqüenta minutos, criava situações conflitantes e perturbadoras para o aluno, nesta faixa etária.
O rigor de tempo, com aulas de cinqüenta minutos, interfere no “tempo psicológico” do aluno. Segundo Piaget, a “duração interior” isto é, o tempo da ação individual, não nasce inteiramente organizado, é construído pouco a pouco a partir do tempo prático ou sensório-motor. O “tempo psicológico” resulta de uma lenta e gradual elaboração, marcada pelas trocas entre o indivíduo e o meio ambiente e social, onde a motivação e o interesse têm papel importante. Nesse contexto, a qualidade do trabalho desenvolvido pelo professor e a forma como se relaciona com seus alunos, dispensando-lhes atenção, ouvindo-os e incentivando-os, tem importância fundamental na relação de ajuda quanto ao ajustamento do “tempo psicológico” do educando à nova rotina de horários.
Outro aspecto marcante, decorrente das diferenças entre os procedimentos didáticos era a diversidade nas interações professor-aluno. Condicionado pela "falta de tempo" o professor não dava a devida atenção ao aluno. Evidenciou-se na pesquisa junto aos alunos e professores, assim como no referencial da literatura que as causas da ruptura entre a quarta e a quinta série não se limitavam ao aumento do número de professores e disciplinas. Uma das grandes causas era a forma de condução do processo ensino-aprendizagem, com saberes diversos, objetivos distintos e as intenções e crenças de seus professores. Percebeu-se também que a escola e os professores não eram insensíveis a essas diferenças e buscavam soluções para os problemas detectados, embora se dedicasse tempo mínimo à sua discussão.
Verificou-se a necessidade de maior empenho na discussão do problema, por parte dos gestores educacionais, oportunizando o aperfeiçoamento profissional dos
professores, se possível, no próprio contexto educacional. Percebeu-se que o professor tem consciência de seu papel na promoção da aprendizagem do aluno, oportunizando um ambiente propício, motivando e gerando confiança, utilizando recursos adequados, respeitando as dificuldades individuais e acreditando no potencial do educando, promovendo sua auto-estima e encorajando-o. Entretanto, não se evidenciou, na prática diária, a efetivação dessa consciência crítica por parte de muitos professores.
Além do conhecimento do processo de aprendizagem, em geral, deve-se conhecer, também o lugar ocupado pela dimensão afetiva no desenvolvimento do processo ensino-aprendizagem. Permeando todos esses aspectos, alertamos para o fato de que não apenas as experiências afetivas do educando, mas também as experiências afetivas dos que ensinam, influem no processo ensino-aprendizagem. Reconhecer a natureza dessas influências exige tanto autoconhecimento como sensibilidade para a realidade e para o desejo do outro, assim como o conhecimento de que a mediação do processo ensino-aprendizagem, onde a experiência afetiva é o elemento regulador de uma série de outras experiências fundamentais à aprendizagem como prestar atenção, observar, associar, lembrar, relacionar, etc. O professor deve ter a preocupação constante de atualizar-se, pois a educação permanente é fundamental para todos os indivíduos e mais ainda, para os educadores, oportunizando o desenvolvimento de competências necessárias à sua atuação profissional, com vistas a favorecer o desenvolvimento integral do educando e o sucesso do processo ensino-aprendizagem. No contexto educacional atual compete aos gestores escolares pensar o processo educacional e as ações da escola, definindo uma proposta político-pedagógica capaz de garantir uma participação responsável e comprometida de todos os atores do processo, tendo em vista a consecução dos objetivos educacionais e o sucesso dos projetos pedagógicos. Para que isso aconteça deve-se oportunizar a formação continuada do educador, em consonância com as necessidades da organização escolar.
Na tentativa de concluir ficamos com a certeza de que a proposta de possíveis soluções, objetivando evitar a ruptura entre a quarta e a quinta série não se esgota neste estudo, vislumbrando a realização de novas pesquisas. Temos a firme convicção de que grande parte da eficácia do processo educativo, na quinta série do ensino fundamental, centra-se no professor, em seus conhecimentos e na qualidade do relacionamento com seu aluno. Portanto, torna-se de vital importância, promover o desenvolvimento desse professor, orientando-o e assistindo-o na organização de um ambiente escolar e processo ensino-aprendizagem significativo para o educando. Assim, o professor permitirá a formação de jovens que pensem, sintam e atribuam valores, como indivíduos criativos e produtivos, conscientes de seu próprio valor pessoal, interessados na condição do homem, capazes de idealizar e vislumbrar um futuro melhor, do qual possam fazer parte.



REFERÊNCIAS
COLL, César S. A Aprendizagem escolar e Construção do Conhecimento. Porto Alegre: Artes Médicas, 1994.
COLL & SOLÉ. A interação professor/aluno no processo ensino e aprendizagem. In: COLL, C., PALACIOS, J. E MARCHESI, A. Desenvolvimento Psicológico e Educação. Psicologia e educação. Porto Alegre: Artes Médicas, 1996.
DELORS, J. et al. Educação: um tesouro a descobrir. SP: Cortez; Brasília, DF: MEC: UNESCO, 2001.
MEIRIEU, Philippe.. Aprender... Sim, Mas Como? Porto Alegre: Artmed, 1998.
PIAGET, Jean. Seis Estudos de Psicologia. RJ: Forense, 1964.
Psicologia e Pedagogia. RJ: Forense, 1970.
Psicologia da Inteligência. RJ: Zahar, 1977.
Para onde vai a Educação RJ: José Olympio, 1998.
WADSWORTH, B.J. Inteligência e Afetividade da Criança na teoria de Piaget. SP: Pioneira, 1997. 9

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